ࡱ> '`3bjbj.3||||`L 2 4 4 4 4 4 4 $i!h#tX X m    2  2     FK6|$ 2 0  E$:E$ E$ L6 :,f<X X   || MACHADO, Arlindo. A televiso levada a srio. So Paulo: Senac, 2000. AS VOZES DO TELEJORNAL Dentre os gneros televisuais mais conhecidos, o telejornal talvez seja o tpico mais difcil de abordar. Se entendermos o jornalismo, dentro ou fora da televiso, como uma instituio de mediao simblica entre determinados eventos e um pblico de leitores ou espectadores para quem esses eventos podem ser considerados relevantes, quase inevitvel que a discusso a seu respeito seja permanentemente afetada por questes de ordem macroestrutural, como os problemas tico-profissionais envolvendo a seleo e interpretao das notcias, ou aqueles relacionados com o papel das empresas e profissionais na conduo dos conflitos que eles tm por funo reportar. Uma vez que poltica sempre um assunto catalisador (e jamais matria de consenso), fatal que os aspectos polticos da discusso despertem maior interesse que quaisquer outros, ofuscando as demais possibilidades de abordagem. No entanto, por mais suspeita que essa afirmao possa soar a todas essas geraes intelectuais condicionadas a ver poltica em tudo, minha abordagem no busca verificar o grau de politicidade (isto , de comprometimento, de parcialidade) do telejornal ou da empresa que o produz. Meu interesse bem mais delimitado: trata-se de ver como funciona o telejornal enquanto um gnero televisual. A meu ver, o principal problema com relao s abordagens tradicionais do telejornal que elas se restringem apenas anlise de contedos. Veja-se, por exemplo, o mtodo bastante conhecido e absolutamente limitado do Glasgow University Media Group, que consiste em tabular quantas vezes determinado 100 A TELEVISO LEVADA A SRIO telejornal apresenta matrias favorveis ao governo e matrias contra o governo, ou quanto tempo ele dedica a questes relacionadas com a esquerda ou com a direita.1 O equvoco principal desse tipo de abordagem est em pressupor que os telespectadores so ingnuos a ponto de repetir de forma acrlica a "inteno", o parti pris da empresa ou da equipe que faz o telejornal. Em um texto anterior dedicado ao mesmo tema,2 procurei demonstrar como um mesmo telejornal pode ser "lido" diferentemente por diversas comunidades de telespectadores, em funo de seus valores, ideologias e estratgias perceptivas ou cognitivas. Por mais fechado que seja um telejornal, h sempre ambigidade suficiente em sua forma signifcante, a ponto de interditar qualquer "leitura" simples e unvoca, e h tambm autonomia suficiente, por parte do telespectador, de modo a permitir que ele faa uma triagem do que lhe despejado no fluxo televisual. Uma prova de que o pblico filtra e opera "leituras" diferenciadas daquilo que v na televiso o seu prprio comportamento diante do telejornal. Durante a Guerra do Golfo Prsico, houve manifestaes contra a CNN (Cable News Network), nos EUA e em vrias outras partes do mundo, ora por considerar que a rede favorecia o Pentgono e fazia propaganda das foras aliadas, ora por achar que ela abria demasiado espao a Sadam Hussein e lhe dava acesso opinio pblica mundial. Peter Arnett, correspondente da CNN que permaneceu em Bagd durante os bombardeios, foi acusado, por um dos lados, de ser um testa-de-ferro de George Bush e, por outro, de adotar uma orientao pr-Iraque (quando insistia em mostrar, por exemplo, que os bombardeios aliados sobre Bagd estavam atingindo escolas e hospitais civis). Recordemo-nos tambm de que, por ocasio da Guerra das Malvinas, parte do pblico ingls se mobilizou contra a BBC, por considerar sua posio "alternativa" demasiado hostil interveno militar, enquanto outra parte acusou a mesma rede estatal de capitular diante da censura e de sacrificar sua independncia em nome da sobrevivncia. V-se que, na realidade, para um mesmo fluxo televisual, podemos ter diferentes "leituras". Isso quer dizer - como j havia notado antes Dominique Wolton que a significao no telejornal funo do contexto cognitivo ou sociocultural do processo de interpretao, razo por que ela sempre transborda de qualquer inten- Ver Glasgow University Media Group, Bad News (Londres: R&KP, 1976); More Bad News (Londres: R&KP, 1980). Arlindo Machado, "O telejomal em tempo de guerra", em Pr-cincmas e ps-cinemas (Campinas: Papirus, 1997), pp. 262-280. AS VOZES DO TELEJORNAL 101 co.3 Se quisermos realmente compreender como funciona o telejornal, preciso, portanto, abstrair os seus aspectos episdicos e enfrentar o desafio mais difcil, que a sua forma signifcante. Vamos comear a anlise do telejornal examinando um filme de fico. Embora isso possa parecer um contra-senso, o leitor ir entender em seguida que essa escolha se deve ao fato do filme em questo (na verdade, um telefilme) colocar em evidncia a estrutura signifcante do telejornal de uma forma que um telejornal singular jamais poderia faz-lo com seus prprios meios. Trata-se de Special Bulletin, realizado por Edward Zwick e levado ao ar pela rede americana NBC, na noite de 20 de maro de 1983. Como em qualquer outro filme, trabalha-se aqui com uma situao imaginria: um grupo extremista ameaa explodir Charleston, na Carolina do Sul, com uma bomba nuclear, caso o governo americano no se disponha a desarmar suas ogivas nucleares, dando incio a um processo de desarmamento unilateral. O governo recusa-se a dialogar com os extremistas, a situao fica cada vez mais tensa, at que a bomba acaba explodindo, causando uma catstrofe nuclear. Tpica temtica dos tempos da guerra fria, semelhante em vrios aspectos a um clssico da televiso: The War Game (l 965), de Peter Watkins. Mas o que h de original nesse filme que ele foi inteiramente imaginado como se fosse um telejornal, maneira do famoso War of the Worlds, programa de rdio levado ao ar por Orson Welles em 1938. Como seria contada uma histria dessas, caso ela estivesse de fato acontecendo e uma rede de televiso a estivesse reportando? Num filme convencional, no haveria qualquer problema estrutural: a cmera assumiria o ponto de vista imaterial de um sujeito narrador onividente e tomaria todas as imagens e sons considerados importantes para a plena visualizao e audio da histria. Mas como a estrutura aqui a de um telejomal, a coisa fica mais complicada. No se tem acesso, de imediato, a todas as informaes necessrias para a inteligibilidade do evento, uma vez que no h uma entidade narradora central capaz de dar coerncia ao relato. Por conseqncia, a rede de televiso fictcia s pode mostrar os fatos dos quais haja testemunha ocular ou que puderem ser tomados plos seus cinegrafistas e reportados plos seus enviados especiais. Para se ter imagens dos acontecimentos significantes da histria, foi preciso imaginar, de incio, uma situao excepcional, em que um reprter e um cinegrafista da rede de televiso eram feitos prisioneiros dos terroristas, de modo que estes pudessem negociar com o governo "pelo 3 Dominique Wolton, loge du grand publique: une thorie critique de la tlvision, cit., p. 57 102 A TELEVISO LEVADA A SRIO ar". Havia gente da televiso estrategicamente colocada no barco onde se refugiavam os extremistas, no porto onde a polcia cercava o barco, numa plataforma de observao a distncia e nos gabinetes de deciso em Washington. Ao longo da histria ("contada", entretanto, como um relato de telejornal), a dupla de apresentadores desfiava o fio da trama chamando os seus vrios correspondentes e tambm "editava" o filme medida que os colocava no ar. Nada podia ser mostrado, se no estivesse, ao mesmo tempo, enquadrado pelas cmeras dos cinegrafistas e reportado plos reprteres e correspondentes da rede. Ou seja: a enunciao do evento mostrava-se explicitamente como condio fundante do relato e a mediao do staff televisual aparecia como um fato da prpria estrutura significante do telejornal, sem a qual no haveria mensagem alguma. O que esse filme mostra de uma maneira muito clara, quase didtica, que o telejornal no pode ser encarado como um simples dispositivo de reflexo dos eventos, de natureza especular, ou como um mero recurso de aproximao daquilo que acontece alhures, mas antes como um efeito de mediao. A menos que ns prprios sejamos os protagonistas, os eventos surgem para ns, espectadores, mediados atravs de reprteres (literalmente: aqueles que reportam, aqueles que contam o que viram), porta-vozes, testemunhas oculares e toda uma multido de sujeitos falantes considerados competentes para construir "verses" do que acontece. Houve um tempo em que um certo cinema vrt acreditou poder deixar o evento falar por si mesmo, com as vozes que j o constituem e com as imagens que j o definem, sem interveno explcita dos realizadores e com um mnimo de mediao. No telejornal, entretanto, s existem mediaes; os prprios enunciados de reprteres e protagonistas aparecem como mediaes inevitveis e como a condio sine qua non do relato telejornalstico. Essa a razo por que Arnaud Mercier considera a televiso um verdadeiro medium (singular de media), ou seja, "uma relao social estruturada por uma tcnica e pelas lgicas econmicas e profissionais".4 Vejamos um exemplo bem concreto. No jornal impresso, uma notcia poderia ser apresentada da seguinte forma ao leitor: "Um grave acidente envolvendo um automvel de passageiros e um caminho de transporte de mercadorias aconteceu ontem s 18h40 no km 300 da Rodovia Presidente Dutra, com uma vtima fatal, o motorista do automvel, Pedro da Silva, e mais duas outras vtimas que se encontram ainda em estado grave no Hospital Pblico de Taubat, Maria de Oliveira, passageira do automvel, e Joo Xavier, motorista do caminho. Segundo uma 4 Amaud Mercier, Le Journal tlvis (Paris: Presses de Sciences Politiques, 1996), p. 17. AS VOZES DO TELEJORNAL 103 testemunha, o acidente teria sido causado por uma tentativa indevida de ultrapassagem de um nibus, por parte do caminho". Trata-se de um relato seco, impessoal e aparentemente sem marcas de enunciao (parece que ningum est falando, a no ser talvez o coletivo da redao). Num telejornal "padro", essa mesma notcia seria construda de forma muito mais complexa, envolvendo vrios enunciadores, diferentes entonaes e mltiplos nveis de dramaticidade. Inicialmente, o apresentador introduziria a notcia mais ou menos da seguinte forma: "Grave acidente acaba de acontecer na Rodovia Presidente Dutra. Nosso corresponde em Taubat, o reprter Mrio Arruda, j se encontra no local e tem mais detalhes para nos fornecer". Entra no ar o reprter, tendo atrs de si as imagens dos carros retorcidos, rodeados de gente da polcia e curiosos. Com a palavra o reprter: "O acidente aconteceu no km 300, prximo entrada de Taubat, h exatamente uma hora e vinte minutos e envolveu um carro de passageiros e um caminho de transporte de mercadorias, tendo vitimado os motoristas Pedro da Silva e Joo Xavier e mais uma passageira do automvel, Maria de Oliveira. As vtimas j foram removidas para o Hospital Pblico de Taubat. O acidente foi acompanhado de longe por uma testemunha, o Sr. Pedro Padilha, que est aqui ao meu lado e vai nos dizer exatamente o que aconteceu". A cmera move-se para a esquerda do reprter, enquadrando a testemunha, no momento em que esta toma a palavra, ainda sob o impacto do acontecimento: "Eu estava caminhando a p do outro lado da pista, quando vi o caminho tentar ultrapassar um nibus, sem notar que vinha um automvel na pista contrria...". Um novo corte faz retornar o apresentador, na redao do telejornal, permitindo-lhe continuar a costurar a notcia: "Obrigado, Mrio. A nossa reprter Sueli da Silva encontra-se neste momento no Hospital Pblico de Taubat e vai nos dar informaes sobre o estado de sade das vtimas". Entra a reprter, tendo ao fundo o ambiente do hospital e parentes das vtimas chorando: "Estamos aqui ao lado do Dr. Joo Paulo Alcntara, que est atendendo s vtimas do acidente na Rodovia Dutra, e ele vai nos dizer qual a situao dos pacientes". Toma a palavra o doutor, depois de um reenquadramento da cmera: "Infelizmente, o motorista do automvel acaba de falecer h poucos minutos, devido a uma hemorragia cerebral. A situao das outras duas vtimas ainda grave, mas acredito que podero sobreviver...". Ao todo, cinco sujeitos falantes (apresentador, testemunha, doutor e dois reprteres), em diferentes ambientes, com diferentes acentos emocionais, so mobilizados para construir um relato que, no dia seguinte, no jornal impresso, seria enfocado apenas por uma voz impessoal, desdramatizada e sem marcas enunciativas. Tecnicamente falando, um telejornal composto de uma mistura de distintas fontes de imagem e som: gravaes em fita, filmes, material de arquivo, fotografia, 104 A TELEVISO LEVADA A SRIO grficos, mapas, textos, alm de locuo, msica e rudos. Mas, acima de tudo e fundamentalmente, o telejornal consiste de tomadas em primeiro plano enfocando pessoas que falam diretamente para a cmera (posio stand-up), sejam elas jornalistas ou protagonistas: apresentadores, ncoras, correspondentes, reprteres, entrevistados, etc. De fato, o quadro bsico do telejornal consiste no seguinte: o reprter, em primeiro plano, dirigindo-se cmera, tendo ao fundo um cenrio do prprio acontecimento a que ele se refere em sua fala, enquanto grficos e textos inseridos na imagem datam, situam e contextualizam o evento; se tudo isso for ao vivo, mais adequado ainda. Uma outra maneira de resolver a fuso no mesmo quadro de todos os elementos do telejornal mostrar, em primeiro plano, o ncora lendo a notcia no teleprompter, enquanto a imagem correspondente ao que ele anuncia aparece ao fundo, inserida por chroma key ou projetada em monitores presentes no cenrio. A descrio banal, j que banal tambm o quadro elementar de todo e qualquer telejornal. Alis, talvez no exista na televiso um gnero to rigidamente codificado como o telejornal. Os videoartistas Antnio Muntadas e Hank Buli realizaram uma obra exemplar na demonstrao desse postulado. Trata-se de Cross-cultural Television (1987), um vdeo em que as imagens "pirateadas" de telejornais de todo o mundo e editadas segundo suas semelhanas estruturais, demonstram que, malgrado as variaes locais ditadas por especifcidades culturais ou lingsticas e por diferenas de suporte econmico, o telejornal se constri da mesma maneira, se enderea de forma semelhante ao telespectador, fala sempre no mesmo tom de voz e utiliza o mesmo repertrio de imagens sob qualquer regime poltico, sob qualquer modelo de tutela institucional (privado ou pblico), sob qualquer patamar de progresso cultural ou econmico. O que importa, porm, extrair as conseqncias necessrias dessa estrutura bsica: o telejornal , antes de mais nada, o lugar onde se do atos de enunciao a respeito dos eventos. Sujeitos falantes diversos se sucedem, se revezam, se contrapem uns aos outros, praticando atos de fala que se colocam nitidamente como o seu discurso com relao aos fatos relatados. O telejornal uma montagem de vozes, muitas delas contraditrias, e sua estrutura narrativa no suficientemente poderosa para ditar a qual voz ns devemos prestar mais ateno, ou qual delas deve ser usada como moldura para, atravs dela, entender o resto.5 5 John Fiske, Television Culture, cit., p. 304. AS VOZES DO TELEJORNAL 105 Se a sua histria tivesse sido outra, o telejornal poderia ter adotado para si o modelo do documentrio: um apresentador recitaria um texto absolutamente coerente e sistemtico, preparado por roteiristas e assessorado por especialistas, enquanto se poderia mostrar imagens e sons relacionados com esse texto. Mas, ao longo de sua histria, o telejornal foi arquitetando uma outra estrutura de apresentao, baseada em depoimentos dos sujeitos implicados no acontecimento, seja diretamente (como o caso dos protagonistas, aqueles que fazem ou testemunham o evento), seja indiretamente (os enviados da televiso para "reportar" o evento). Por essa razo, tomou-se essencial a presena da televiso no local e tempo dos acontecimentos, no apenas para autoriz-la como fonte confivel, mas principalmente porque essa a condio sine qua non de seu processo significante. No sem razo que o telejornal, muitas vezes, trata no propriamente dos eventos, mas de suas prprias dificuldades em report-los. Quando se est numa situao de conflito particularmente perigosa, a presena fsica do reprter no palco dos acontecimentos e a obteno de imagens e sons representativos do que ocorre tornam-se em si mesmas problemticas e no raro que tais dificuldades afetem a prpria substncia do telejornal. No caso da Guerra do Golfo, os episdios mais significativos dessa colocao em evidncia das condies de produo foram aqueles ocorridos em Israel e na Arbia Saudita, quando os reprteres foram constrangidos, como os demais mortais, a utilizar mscaras contra gases. Na noite de 17 de janeiro de 1991, a CNN mostrou uma cena dos seus prprios escritrios em Jerusalm, onde jornalistas nervosos, mal conseguindo disfarar seu medo, discutiam entre si se deveriam ou no usar suas mscaras quando estivessem no ar. Tanto a CNN quanto a TF l francesa mostraram Scuds (msseis iraquianos) caindo sobre Riad, no mesmo momento em que os seus enviados especiais estavam falando ao vivo e o que se seguiu, em tais episdios, foram instantes de pura estupefao, quando a possibilidade de uma destruio ao vivo do reprter tornou-se tangvel. Nestes instantes, percebemos que os reprteres no so, como se poderia imaginar, transparentes aos eventos, mas criaturas mortais, submetidas mesma sorte dos demais cidados das naes em conflito, um pouco atrapalhados com suas mscaras contra gases, um pouco tambm ocupados em sua tentativa, nem sempre bem sucedida, de dominar o prprio terror. No telejornal, a voz relatora permanece sempre atada a um corpo, corpo este submetido, como os demais ao seu redor, s leis do espao fsico onde ele est situado. O fato de todas essas vozes terem um nome (os reprteres so sempre identificados no telejornal) tambm bastante significativo para a individualizao 106 A TELEVISO LEVADA A SRIO do relato, ou mais exatamente, para uma identificao de um relato com um sujeito enunciador. Raymond Williams observa que a identificao da voz foi introduzida, no rdio e na televiso, por ocasio da Segunda Guerra Mundial, como medida de segurana para a eventualidade de uma invaso ou captura de emissoras.6 De l para c, a identificao do pessoal da televiso foi ficando cada vez mais marcada, a ponto de chegar, com o modelo norte-americano de telejornal, a constituir uma regra. Hoje, na maioria dos telejornais, a notcia vem quase sempre personalizada, atravs de legendas que especificam quem fala, qual a sua funo no telejornal ou no evento ("Correspondente em Londres", "Governador da Califrnia", etc.) e s vezes tambm o lugar de onde se fala. Em geral, a identificao integral reservada a personalidades e ao staff da prpria emissora ou rede, enquanto gente do povo conta apenas com uma identificao genrica ("testemunha", "parente da vtima", "grevista", "manifestante", etc.). Dessa forma, o antigo modelo de telejornal, derivado da prtica radiofnica e apoiado basicamente num locutor que l um script, foi sendo substitudo aos poucos pelo modelo que tem hoje na CNN o seu melhor representante, onde a tarefa de construir o noticirio do dia repartida entre os vrios sujeitos falantes que povoam a tela. Ao ressaltar a interveno dos reprteres e dos protagonistas como a de um grupo de pessoas que fala a respeito de coisas que viu, que sabe ou nas quais est envolvido, o telejornal acaba por transformar a apresentao pessoal no prprio modo de constituio de sua estrutura significante. H ocasies em que a legenda designa no propriamente quem fala, mas a origem do material audiovisual que est sendo exibido ("Imagens das Malvinas divulgadas pelo governo ingls", "Material de divulgao do Pentgono"), o que no deixa de ser tambm uma forma de identificao. No conhecido episdio da Guerra do Golfo, a CNN, constrangida pelo forte aparato de censura montado pelos militares em todas as frentes de combate, forneceu o modelo de como se faz telejornalismo num contexto de presses e censura generalizada: nomeou as origens de todas as imagens. Ao longo do fluxo televisual, o que se colocava ao exame dos nossos olhos e ouvidos no era uma simples sucesso de imagens sem marcas; pelo contrrio, as imagens apareciam identificadas por suas condies de enunciao. Cleared by Israeli military (censurado pelo exrcito israelense), cleared by Saudi govt. (censurado pelo governo saudita), cleared by Iraqui censors (censurado plos censores iraquianos), images from Iraqui TV (imagens da TV do Iraque) eram legendas necessrias, que acompanhavam as imagens e os sons 6 Raymond Williams, Tele\'ision: Technology and Cultural Fbrm, cit., p. 47. AS VOZES DO TELEJORNAL 107 como que os emoldurando numa advertncia: Cuidado! O que voc est vendo e ouvindo pode ser uma verso distorcida e interesseira! A insistncia com que as legendas se sucediam na tela nos autorizava a concluir que, na realidade, o fluxo televisual inteiro deveria ser colocado sob suspeita. Raras vezes o telejornal foi to crtico em relao a si prprio e raras vezes ele esteve to autoconsciente de sua prpria implicao nos acontecimentos. Certamente, existem variantes dessa estrutura bsica. Alguns modelos menos ortodoxos de telejornal podem "mascarar" essa situao de mediao, atravs da incorporao sutil de recursos narrativos da fico audiovisual (por exemplo, msica "dramtica" na trilha sonora e at mesmo reencenao dos acontecimentos com atores), enquanto outros, pelo contrrio, podem coloc-la a nu, fazendo basear o relato j no mais em atos de enunciao diversificados e heterogneos, mas na autoridade de um ncora onisciente, onividente e onipresente, uma espcie de voz consensual que se intromete nos relatos e os fecha com um comentrio de tipo editorial. Walter Cronkite e Dan Rather, na televiso norte-americana, e Bris Casoy, na televiso brasileira, so os representantes mais conhecidos deste ltimo modelo de telejornal em que a voz over do apresentador costuma se sobrepor s matrias e s outras vozes do telejornal, emoldurando-as com o crivo de seu comentrio. Vozes demasiado ruidosas ou demasiado "radicais" no tm espao nessa estrutura; elas so antes reportadas pelo ncora, sempre que h necessidade de se representar seus pontos de vista. Nos casos mais fortemente personalizados, o apresentador no somente um ncora, mas costuma acumular tambm os cargos de chefe de reportagem, diretor geral e produtor. O programa, na verdade, lhe pertence. Em casos como esse, o ncora no pode ser despedido pela empresa televisual, ao contrrio de qualquer outro funcionrio. Se acontece algum conflito com a rede que abriga o programa, o ncora simplesmente se muda para outra, levando consigo o programa inteiro, isto , o nome, o formato, a equipe, os patrocinadores, possivelmente at os telespectadores. No modelo "padro", pelo contrrio, o relato telejornalstico imaginado como uma estrutura destituda de entidade narradora central, na qual o evento reportado atravs das falas de seus protagonistas e/ou dos enviados especiais da prpria televiso. A funo do apresentador nessa estrutura consiste basicamente em ler as notcias e amarrar os vrios enunciados, chamando os outros protagonistas, mas no lhe cabe tecer comentrios ou extrair concluses. O reprter goza a de uma grande autonomia; ele est, por assim dizer, na fronteira intermediria entre a voz institucional e a voz individual e constitui uma espcie de interface entre a televiso e o evento. A interveno de cada reprter encontra-se marcada 108 A TELEVISO LEVADA A SRIO por uma espcie de "assinatura" individual: ela tem algo de pessoal, de subjetivo. Nesse sentido, pode-se mesmo dizer que cada reprter contribui de forma diferente para a enunciao de um nico evento. A CNN o melhor exemplo deste modelo de telejornal. No conhecido episdio da Guerra do Golfo, as figuras mais importantes da cobertura realizada pela rede de cabo norte-americana no foram os apresentadores, mas os reprteres (Peter Arnett, Bernard Shaw, John Holliman e outros), presentes de carne e osso no palco dos acontecimentos e de l transmitindo ao vivo. O que salta, enfim, desse modelo a idia de telejornal como polifonia de vozes, cada uma delas existindo de forma mais ou menos autnoma e prescindindo de qualquer sntese global. Uma forma eficaz de diferenciar entre os dois principais modelos de telejornal verificar se existe alguma hierarquia entre as diversas vozes que se rivalizam na arena do telejornal. Se o ncora tem poderes de decidir sobre as vozes que entram e saem, portanto de delegar voz aos outros, se ele permanece a fonte principal de organizao dos enunciados, estamos diante de um telejornal de modelo centralizado e opinativo. Caso contrrio, ou seja, quando o apresentador aparece como uma voz que expressa a opinio mais esparsa ou mais difusa de um corpo de redatores, quando o staff'parece ter o mesmo peso e a mesma importncia que ele na conduo do relato, ento estamos diante do telejornal de modelo polifnico. Neste ltimo modelo, o apresentador mais exatamente um condutor, em geral impessoal, cuja funo principal ler as notcias (visivelmente escritas por outros) e abrir passagem para os outros protagonistas. O enunciado televisual, neste caso, se constri atravs de um discurso indireto: o apresentador chama o reprter, que por sua vez chama o entrevistado e assim vamos encaixando uma voz dentro da outra, como no recurso lingstico das citaes. No por acaso, nesse tipo de estrutura, o apresentador nunca usa a primeira pessoa (nunca diz "eu acho..."), mas recorre sempre ao plural quando precisa designar o agente enunciador ("ns, do telejornal X, achamos que..."). Mas a verdade que, nesse modelo de telejornal, tanto o apresentador quanto os reprteres evitam, sempre que possvel, dizer o que pensam sobre a notcia (mas no vetado, aos entrevistados e testemunhas oculares, tomar posio diante dos acontecimentos e manifestar emoo ou indignao em relao a eles). A opinio explcita, quando existente nessa modalidade enunciativa, jamais cabe ao apresentador ou aos reprteres, mas aos comentaristas. H, portanto, nesse modelo de telejornal, uma clara distino entre quem colhe e apresenta as notcias (os jornalistas) e, de outro lado, quem as interpreta (os analistas, os especialistas). No dia 7 de junho de 1998, Peter Arnett, frente do programa NewsStand da CNN, noticiou que o AS VOZES DO TELEJORNAL 109 exrcito norte-americano havia utilizado gs mortal para matar seus soldados desertores no Laos, durante a guerra do Vietn. A histria depois se provou ser inverdica e a CNN teve de retratar-se. Chamado a explicar-se, Arnett defendeu-se dizendo que no foi o autor da matria; ele apenas a leu e a chamou como um apresentador, devendo a responsabilidade do equvoco ser dividida entre todos os envolvidos na produo do programa. H uma certa tendncia hoje de chamar de "tradicional" ou "convencional" o telejornalismo de tipo polifnico e de "moderno" ou "ps-moderno" o tipo opinativo.7 No entanto, o telejornalismo opinativo, com forte personalizao do apresentador, existe desde os primrdios da televiso. No preciso muito esforo para comprovar isso. Basta citar o caso de See It Now, o atrevido telejornal norte-americano encabeado por Ed Murrow entre 1951 e 1958. Murrow foi o apresentador que, atravs da mobilizao da opinio pblica, enfrentou e derrubou o todo-poderoso senador Joseph MacCarthy e seu programa de "caa s bruxas" entre 1953 e 1954. Na verdade, do ponto de vista de seus efeitos, ambos os modelos de telejornal tm as suas virtudes e os seus problemas. Um telejornal opinativo pode ser teoricamente prefervel, uma vez que pode exercer uma influncia mais ativa junto opinio pblica e produzir uma mobilizao real. Alm disso, esse tipo de telejornal deixa entrever mais abertamente os seus compromissos, em lugar de esconder o seu ponto de vista sob a mscara de uma pretensa neutralidade. Mas no podemos nos esquecer das trgicas consequncias desse tipo de telejornalismo, sobretudo em conjunturas polticas mais fechadas, como as ditaduras de direita ou de esquerda, quando a televiso foi utilizada, por apresentadores comprometidos com os regimes vigentes, para mobilizar a massa popular contra os "traidores da ptria" e para convencer os telespectadores a delatar os opositores, quando no a "justi-los" com as prprias mos (como aconteceu na Romnia, em 1990, durante o governo de Ion Iliescu). Um telejornal opinativo sempre uma faca de dois gumes, pois tudo uma questo de saber qual a opinio que ele adota. Por sua vez, o modelo "polifnico" de telejornalismo pode ser acusado, no sem razo, de tentar mascarar o fato de que toda produo de linguagem emana de algum, ou de um grupo, ou de uma empresa, portanto nunca o resultado de um consenso coletivo, mas de uma postura interpretativa "interessada" diante dos fatos noticiados. No entanto, ao contrrio do modelo anterior, ele no pode ser acusado de atentar contra a inteligncia do espectador ou de pressupor qual- 7 Ver, por exemplo, Eliseo Vern, Construir el acontecimienio (Barcelona: Gedisa, 1995), p. 88. 110 A TELEVISO LEVADA A SRIO quer incapacidade interpretativa por parte da audincia. De fato, enquanto o modelo "opinativo" baseia-se fortemente em mecanismos de identificao entre pblico e apresentador (nesse sentido, no raro que, para colocar em operao esses mecanismos, o apresentador simule indignao, pesar ou temor diante das noticias apresentadas), o outro modelo no induz - pelo menos no ostensivamente - uma interpretao ou uma emoo que devam ser reiterados pelo espectador. Um modelo, portanto, no pode ser em si melhor ou pior que o outro: preciso examinar cada caso individual e sua conjuntura concreta. O QUE INFORMA UM TELEJORNAL? Talvez, o principal problema com relao compreenso do telejornal seja o pressuposto bastante generalizado de que a funo bsica desse gnero televisual informar (bem ou mal) sobre o que est acontecendo. Como esse um pressuposto universalmente aceito, em geral as abordagens de telejornais se restringem a tentar verificar o grau de exatido ou de confiabilidade da informao veiculada. Bem, no se pode dizer que essa abordagem seja em princpio equivocada, pois, se abstrairmos aquele contingente de espectadores que vm televiso por pura letargia, pouco importando para eles o que se est transmitindo, a maioria do pblico "voluntrio" vai ao telejornal para saber o que est acontecendo nas reas da poltica, da economia, da cultura, da cincia, da vida pblica, etc. Mas ao colocar em circulao e em confronto as vozes que "relatam" ou "explicam" um conflito, ao tentar encaixar as vozes umas "dentro" das outras, o que faz mais exatamente o telejornal produzir uma certa desmontagem dos discursos a respeito dos acontecimentos. Num certo sentido, podemos dizer que o telejornal uma colagem de depoimentos e fontes numa seqncia sintagmtica, mas essa colagem jamais chega a constituir um discurso suficientemente unitrio, lgico ou organizado a ponto de poder ser considerado "legvel" como alguma coisa "verdadeira" ou "falsa". As informaes veiculadas nesse gnero televisual constituem, antes de mais nada, um processo em andamento. O telejornal, no o esqueamos, um programa realizado ao vivo, ainda que utilize material pr-gravado ou de arquivo, e em geral "fechado" poucos minutos antes de entrar no ar, ainda com as ltimas notcias chegando redao. Por mais que se queira ou se possa manipular as informaes, elas chegam ao telespectador ainda no inteiramente processadas, portanto brutas, contraditrias, sem ordenao, sem acabamento final. No caso da Guerra do Golfo, por AS VOZES DO TELEJORNAL 111 exemplo, a CNN fazia desfilar diante do telespectador os depoimentos esquivos e escorregadios de George Bush e Sadam Hussein, da gente do Pentgono, dos comandantes militares, dos correspondentes em Riad, Ama, Tel Aviv, Bagd e Washington, dos "especialistas" em geopoltica e assuntos militares, mas nenhum desses depoimentos era suficientemente eloqente para emoldurar o acontecimento como um todo, ou fazer encaixar as peas do quebra-cabea, para que elas pudessem se articular em algum ponto e perfazer um relato coerente (mesmo que equivocado ou mentiroso) sobre o conflito. Ao embaralhar no fluxo televisual os materiais originrios de fontes diversas, o telejornal coloca em choque os diferentes enunciados e os relativiza ou os anula no mesmo momento em que lhes d publicidade. Quando a CNN lana ao ar sucessivamente um material publicitrio do Pentgono e outro da TV Iraque, a nica "leitura" possvel para o espectador que se trata de diferentes "verses" da guerra. O fluxo telejornalstico inteiro no passa de outra coisa que uma sucesso de "verses" do mesmo acontecimento. A questo da verdade est, portanto, afastada do sistema significante do telejornal, pois, a rigor, no com a verdade que ele trabalha, mas com a enunciao de cada porta-voz sobre os eventos. Numa guerra, numa revoluo, em qualquer tipo de conflito social, todos resultam em alguma medida "mentirosos", ou seja, todos reduzem o evento ao seu prprio ponto de vista. O telejornal, mesmo quando tenta construir a sua "verso", em seus modelos mais personalizados ou autoritrios, o que ele consegue, no geral, relativizar ou neutralizar as vrias "verses", jogando umas contra as outras. No Afeganisto, por exemplo, a CNN tinha acesso tanto s autoridades locais pr-soviticas quanto guerrilha e colocava no ar material e depoimentos de ambas. No segundo dia da invaso do Panam, Bush iniciou um pronunciamento pblico nao alguns minutos antes do desembarque dos corpos dos soldados mortos na base area de Delaware, como forma de impedir que a televiso pudesse transmitir ao vivo o evento incmodo; a CNN, entretanto, juntamente com a rede CBS, dividiram a tela ao meio e mostraram simultaneamente os dois eventos. Se a televiso se mostra incompetente para construir um relato coerente da guerra ou de qualquer conflito (mas essa "incompetncia" pode ser mais uma virtude do que um defeito, pois pior seria uma verso fechada do evento, segundo a interpretao oficial), ela est apta, todavia, a nos fornecer uma outra viso do evento, ou seja, o conflito como um emaranhado de vozes que se chocam ao longo do fluxo televisual, nenhuma delas inteiramente convincente, nenhuma delas inteiramente desprezvel. O telejornal tambm um front onde se travam batalhas decisivas e muitos conflitos so ganhados ou perdidos mais na televiso do que nos campos de bata- 112 - A TELEVISO LEVADA A SRIO lha. Todos sabem disso (alis, o terrorismo a conseqncia mais direta desse postulado), mas a atitude dos protagonistas da histria em relao a esse fato sempre contraditria. De um lado, todos os implicados nos mais diversos tipos de conflitos sempre buscam, em alguma medida, conquistar espao nos telejornais para colocar a sua "verso" dos acontecimentos. No caso da Guerra do Golfo, os equipamentos de transmisso da CNN no foram destrudos nem silenciados, seja pelos iraquianos, seja plos aliados, embora todos conhecessem perfeitamente a sua localizao no Hotel Al Rachid, em Bagd. A razo bvia: de ambos os lados se suspeitou que a rede de cabo norte-americana lhes poderia ser til em diversas circunstncias e no valia a pena criar uma situao que pudesse coloc-la do lado inimigo. J no conflito militar dos Blcs em 1999, quando a Otan (Organizao do Tratado do Atlntico Norte) decidiu bombardear objetivos na Iugoslvia, pareceu claro aos protagonistas de ambos os lados que a televiso estava sendo usada (ou poderia ser usada) pelo inimigo. O resultado foi, de um lado, o bombardeamento da sede da Televiso Estatal da Iugoslvia, em Belgrado, a mando da Otan, com um saldo de 25 jornalistas mortos; de outro lado, o assalto popular aos escritrios da CNN em Belgrado e a destruio de todos os equipamentos e instalaes, com um prejuzo estimado em um milho de dlares. Como se v, a ambigidade "informativa" do telejornal produz incertezas nas cabeas de estrategistas e protagonistas dos conflitos, que nunca conseguem saber com clareza se o telejornal simptico ou hostil s causas alegadas e se a televiso ajuda ou atrapalha numa situao de confronto militar. H uma ponta de ingenuidade na insistncia com que muitos analistas e intelectuais tentam provar que os telejornais no so neutros, nem objetivos, nem imparciais, refletindo antes uma produo ideolgica. Se a televiso coloca trs opinies favorveis ao governo e apenas uma contra, no se pode da deduzir que o espectador vai necessariamente endossar as opinies majoritrias. Pode at ser que, a partir das opinies apresentadas, ele forme uma terceira, nem sequer cogitada na tela. Do fato de predominar no vdeo matrias, entrevistas e depoimentos tomados de um dos lados do conflito, do fato ainda de se suspeitar, por parte dos artfices do telejornal, de uma posio institucional simptica, em ltima instncia, a esse lado, no se pode concluir, entretanto, que o espectador vai fazer uma "leitura" previsvel das imagens e dos sons difundidos. No existem, nos telejornais, desinncias, sinalizadores, dispositivos de emolduramento que orientem a leitura no sentido de como se deve "ler" esses depoimentos e essas inseres de fontes, ou capazes de designar a voz "doadora", sob a batuta da qual deveramos reenquadrar todas as outras. Mesmo os telejornais opinativos, em AS VOZES DO TELEJORNAL -113 que h forte direcionamento da "leitura", no esto inteiramente livres de um reordenamento personalizado e imprevisvel por parte do telespectador. Por mais que o telejornal seja acusado de maniquesmo ou comprometimento, na verdade, ele turva qualquer perspectiva clara dos acontecimentos, ele embaralha as razes dos lados em conflito, ele obscurece as fronteiras e promove a confuso dos argumentos, mesmo quando nomeadamente assume uma das foras beligerantes. Ele coloca, em todo caso, a dificuldade de se tomar partido diante da complexidade dos interesses que vo sendo colocados em jogo, medida que progride o fluxo das imagens e dos sons. Por no favorecer uma viso coerente e sistemtica dos conflitos e por fazer multiplicar, por outro lado, imagens, opinies, depoimentos que no se encaixam no quebra-cabea final, o telejornal acaba por semear confuso ali mesmo onde, sob a rubrica da "informao", deveria haver ordem, coerncia e sistematizao da notcia. Da a dificuldade das prprias foras em conflito em situar exatamente a posio da mdia na guerra. Peter Arnett, apesar de americano, no foi considerado inimigo em Bagd, tendo sido inclusive utilizado por Hussein para se dirigir ao Ocidente. Durante a Guerra das Malvinas, os reprteres da BBC continuaram transmitindo de Buenos Aires normalmente e no foram molestados pelo governo militar por serem britnicos. Em circunstncias de extrema gravidade, o sonho imperial de um controle absoluto das telecomunicaes se choca continuamente com a prpria dinmica da televiso e do telejornal. As imagens chegam s nossas casas na velocidade das ondas eletromagnticas, antes mesmo que os ncoras possam ler seus scripts, antes ainda que os reprteres possam preparar suas falas ou que os censores possam estudar as conseqncias de cada emisso. Para as geraes que aprenderam a acompanhar os acontecimentos atravs do News a Teu (ITN, Gr-Bretanha), World News Tonight (ABC, EUA), The CBS News (CBS, EUA), Tagesschau (ARD, Alemanha), Heute (ZDF, Alemanha), NHK Shinbun (NHK, Japo), Jornal Nacional (Globo, Brasil), Vremia (transmitido obrigatoriamente em todos os canais da antiga Unio Sovitica, durante o regime comunista), ou da prpria 'CNN, a iluso de uma autoridade diretiva da televiso est longe de corresponder realidade.8 8 Arlindo Machado, "O telejornal em tempo de guerra", cit., pp. 262-280. ,EFH  W_`G|jZG7h.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH"h.,S@B*H*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH h.,SCJ/h.,SB*CJOJQJRHR^JaJmHphsH h.,S6]h.,S h.,S5\h.,S5CJ\h.,S6B*CJ]aJphfh.,SB*CJaJphfh.,S5B*CJ\aJphfFGH_`g   d2-DM ^ $a$$d-DM a$V-DM ^V$`a$3G^_(SfA CLcq|ѱzzh^L#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,SCJmH sH #h.,S@B*CJaJmH phsH %h.,S6B*CJ]aJmH phsH h.,SB*CJaJmH phsH h.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*H*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsH */0v#(7!qȸok[H[8oh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsH"h.,S@B*H*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S6CJ]h.,SB*CJaJmHphsHh.,SB*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH)h.,S6@B*CJ]aJmHphsH *+n#o######G'=,$0+d-DM ]0^+`a$$}d-DM ^}a$-DM ^$d-DM `a$$Vdx-DM ^Va$ qW8){f @!!!."z""m#o#ܾήܾܾxhXxξTh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHo#########I$$$%%&f&&&&'ųscUsEc2c%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,S/h.,SB*CJOJQJRHP^JaJmHphsHh.,SmH sH h.,S6CJ]mH sH h.,SCJmH sH 'F'G'''-(b(l(x(()g))))**<+G+T+++++++*,;,˻ۘrbObObۘ%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsH;,<,=,,,-.X.Y.j.~......*/z//0i00 1Z11ʺsmUmںEEh.,S@B*aJmHphsH/h.,SB*CJOJQJRHS^JaJmHphsH h.,SCJ)h.,S6@B*CJ]aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S"h.,S@B*H*aJmHphsH=,Y.....9y:z:{::: Bnn$d-DM ^a$-DM ^$d-DM ]`a$$d-DM ]a$$>-DM a$ -DM ^ $nd-DM ]n`a$ 1M2227333&4r445d5 6\666K7885999y:{:::::u;ϿϟϏ߯ϟ{c]K#h.,S@B*CJaJmHphsH h.,SCJ/h.,SB*CJOJQJRHR^JaJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHu;;;;><<<3=====$>8>C>u>>????@Q@@@HAA B BUB`B̼̬ܜ̜yfXܜTXh.,Sh.,SB*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsH`BBBBtttuumuuvXvvvDwww.x}xyzZzpzqzz {ͽyiViiͭͭ͋%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH"h.,S@B*H*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH! {W{{{D|E|g|||||||}h}ϿgaO?/h.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH h.,SCJ5h.,S5B*CJOJQJRHP\^JaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmH phsH )h.,S6@B*CJ]aJmH phsH #h.,S@B*CJaJmH phsH h.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHqzE||||||,IІцjjh$d-DM ]`a$$ dB-DM ^ `a$$ju-DM ^ja$$nd-DM ^na$-DM ^ -DM ^ $"d-DM ]"`a$ h}~R~~~~~+,HIԀ n `߼︠ϊwggTgB#h.,S@B*CJaJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH h.,SCJ/h.,SB*CJOJQJRHQ^JaJmHphsHh.,S%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH,8L3~΄=Fm4ІC۴~i~eSeCh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,S)h.,S6@B*CJ]aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH)h.,S6@B*CJ]aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH:789[\ ͝p$#-DM a$$>d-DM ]>`a$$0d-DM ^0a$-DM ^$Md-DM ]M`a$$d-DM ]`a$$"d-DM ^"a$ Cׇ'r9:܉(v KSoċӋދdWO:؏*z͐Ͽϛ߫ψϫueUϿUϫUeh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH!͐h689Z[\M˻nhVF6h.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH h.,SCJ/h.,SB*CJOJQJRHV^JaJ mHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHM2ɔkYBڗ'wɘ PCڛ-vǜcϿߡߡ߿ﱍzgϝ%h.,S6@B*]aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#ȝ̝͝ΝbcHޟ,xʠ7У!bǻyiYYYIiyih.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,Sh.,S@B*aJmHphsHh.,SB*aJmHphsHh.,SB*CJaJph h.,SCJ3h.,S@'B*CJOJQJRHY^JaJmHphsH/h.,SB*CJOJQJRHY^JaJmHphsH͝Νc123$5d-DM ]5a$ -DM -DM ^$d-DM `a$$>d}-DM ^>a$>d}-DM ^>bcns|COYdwϥۥ ͦͺͪxxeeeͺͺUC"h.,S@B*H*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsH!h.,S6B*]aJmHphsHh.,SB*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH%h.,S6@B*]aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsHh.,S@B*aJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsH0123h.,SmHsH h.,SCJ#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,SB*CJaJmHphsH#h.,S@B*CJaJmHphsHh.,S,1h/ =!"#$% @@@ NormalCJ_HaJmHsHtH~@~ Ttulo 1#$$0-D@&M a$/5B*CJOJQJRHR\^JaJmHphsH8@8 Ttulo 2$@&5\@ Ttulo 3+$$0-D@&M ]a$/6B*CJOJQJRHR]^JaJmHphsH@ Ttulo 4+$$>-D@&M ]a$/5B*CJOJQJRHQ\^JaJmHphsH>A> Fonte parg. padroXi@X  Tabela normal :V 44 la ,k@, Sem lista XC@X Recuo de corpo de texto$`a$3 FGH_`g  *+noG=$Y&&&&&1y2z2{222 :};<<<<<<KGGG H HnNRRRRSST[^^_^`^^^vaiiiiikqrEtttttt,wIw}~~~~:789[\ ͕Εc1250000000000000000000000(0000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000000008000000000000000000Gqo#';,1u;`BDHOvT:ZN_uimq {h}C͐Mb3TWXZ[\]_`acdefhiklmnpqstuvxy=, B P`fqz͝3UY^bgjorw3VTA|}UAVVA WA XA @&C|5@-C}5C*urn:schemas-microsoft-com:office:smarttagsmetricconverter>*urn:schemas-microsoft-com:office:smarttags PersonName T1991, aem andamento. O em Bagd. Aem report-los. Quandoem Washington. Ao ProductIDHJBIJT[`_`   CDLNcdqs *+01()!fmoAFGb !##<$%%%X&Y&~&&&&&&((--./y2{222457799 : :|;};<<<=>>AWBBBCCDDEE=GGGG H HFIGIPKLmNnNQQQQRRORQRRRRTTTX&YYY[[\\^^`^^^^!_uavacceegfhf=hhhhqiriiiiikkklmmnnqqprqrDtEttttv+w,wHwIwww`zH{{{~||}}}}~~~~~~9:vwރA ̕ΕbcޗƘbcCOPwx۝ܝ059>H^  )+mFG<$=$X&Y&&&&&11x2{222 : :|;};<<<<JGKGGG H HmNnNRRSSTT[[]^`^^^uavaiiiikkprqrDtttt+w,wHwIw}}~~~~9:69Z\ ̕Εbc053H^Y&&Ett5HJ5.,S^@HH"THH3@UnknownGz Times New Roman5Symbol3& z Arial"q{F{Fy#TQTQ!242HX)?^2AS VOZES DO TELEJORNAL Milk FamilyIVANOh+'0 $ D P \ ht|AS VOZES DO TELEJORNAL Milk FamilyNormalIVAN2Microsoft Office Word@F#@ֳ@E6@E6T՜.+,0 hp  LeitaoQ' AS VOZES DO TELEJORNAL Ttulo  !"#$%&'()*+,-./0123456789:;<=>?@ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ[\]^_`abcdefghijklmnopqrstuvwxyz|}~Root Entry F$K6Data {1TableE$WordDocument.SummaryInformation(DocumentSummaryInformation8CompObju  F#Documento do Microsoft Office Word MSWordDocWord.Document.89q